As últimas semanas foram marcadas por debates sobre a votação do Projeto de Lei 4330/04, que trata sobre contratos de prestação de serviço a terceiros e as relações de trabalho dele decorrentes. Acredito que tal polêmica, principalmente no que diz respeito a possibilidade de terceirização das atividades-fim das empresas, deve-se muito mais à possibilidade de alteração de condições socioeconômicas periféricas à terceirização do que às suas repercussões diretas. Isto porque, a terceirização das atividades finalísticas de muitos segmentos empresariais já foram entregues a terceiros. Uma estratégia que chamo de segmentação da cadeia produtiva.
Ao avaliarmos a possibilidade de terceirização de qualquer parte da operação de uma empresa, é necessário considerar os seguintes fatores:
- A terceirização otimizará os custos totais da operação?
- A qualidade final do produto ou serviço resultante da operação será melhorada?
- A terceirização pode contribuir para a melhoria do processo operacional?
- Haverá redução significativa do tempo total da operação com a terceirização?
Respostas positivas para esses fatores implicam em melhorias significativas para as condições competitivas do negócio. Mas estes não são os fatores decisivos para caracterizar a terceirização como uma medida de valor estratégico relevante, uma vez que podem ser igualados pelos demais competidores.
O que pode realmente faz grande diferença é o quanto as ações terceirizadas podem agregar valor diferenciado ao negócio ou produto. Isso se caracteriza pela apropriação de tecnologias inovadoras, que possam lançar a organização à frente dos seus concorrentes e não possam ser facilmente imitadas.
Há quem costume dizer que qualquer atividade pode ser terceirizada, desde que ela não seja estratégica para o negócio, mas essa não é uma prática efetiva nos mercados. A verdade é que qualquer parte da operação pode ser terceirizada, desde que reverta em melhoria das condições competitivas da empresa, aumentando a capacidade de geração de valor para o seu cliente final e criando uma vantagem relevante frente aos demais competidores.
A Indústria da construção como exemplo
Um exemplo disso é o que ocorre na indústria de construção. O processo construtivo era executado por uma única empresa, que mobilizava uma enorme quantidade de mão-de-obra para atender todas as atividades inerentes a execução de uma obra.
Um custo enorme era gerado pela alta rotatividade de trabalhadores, resultante da evolução da obra, uma vez que as etapas se sucediam e profissionais de outros tipos e especialidades eram requisitados. A terceirização era a solução mais evidente para a questão e ela foi implementada de maneira bastante simples, em função da segmentação da cadeia produtiva da construção.
Hoje a construtora pode contratar uma empresa especializada para cada etapa ou atividade da obra, contando com pessoal muito mais especializado e reduzindo o custo total da operação. Observem os serviços que podem ser contratados pela construtora:
- Limpeza de terreno e terraplanagem;
- Serviços de carpintaria;
- Serviços de armação;
- Serviços de processamento e lançamento de concreto;
- Serviço de levantamento de paredes;
- Serviços de instalações elétricas, hidrosanitárias e de elevadores;
- Serviços de revestimento e pinturas;
- Serviços de limpeza final da obra e remoção de entulhos, entre outros.
Este conceito foi concebido originalmente pela indústria automobilística, que desenvolveu uma cadeia produtiva capaz de especializar a construção de componentes específicos dos veículos, distribuindo as responsabilidades de pesquisa e desenvolvimento de produtos ao longo dessa cadeia. O salto de qualidade oportunizado por essa estratégia possibilitou uma melhoria que impactou toda a indústria automobilística, mundialmente.
A segmentação da cadeia produtiva pode racionalizar os custos totais, melhorar a qualidade dos produtos ou serviços, incorporar agregado tecnológico relevante para a competição e crescimento da rentabilidade financeira. O que demonstra a eficácia da terceirização, se feita com inteligência e visão estratégica.
Para as empresas que pretendem adotar uma estratégia de terceirização de parte de suas atividades, sugiro uma atenção para os seguintes pontos:
- Avaliar o impacto real da terceirização na operação da empresa e análise detalhada dos resultados advindos dessa estratégia;
- Seleção criteriosa da empresa prestadora de serviços, com averiguação de seu histórico de serviços, de eventuais pendências fiscais e tributárias, idoneidade financeira e a existência de demandas judiciais;
- Especificação clara e minuciosa do objeto da terceirização, bem como das obrigações e responsabilidades das partes;
- Exigir garantias de responsabilidade civil, trabalhista e comercial da prestadora, para custear condições anômalas que possam afetar a continuidade da prestação de serviços;
- Estabelecer processos de controle para garantia da qualidade dos serviços e produtos oriundos da terceirização;
- Garantir que não existe submissão dos colaboradores da contratada a nenhum preposto da contratante;
- Monitorar, ao longo da prestação dos serviços, a saúde econômica, financeira e tributária da contratada, para garantir a continuidade operacional do seu negócio;
- Esteja assistido por um advogado, de preferência especialista nesse tipo de contrato.
Também é muito importante lembrar que o que a empresa deve buscar com uma estratégia de terceirização, não são ganhos de ordem financeira; o objetivo é conseguir ampliar as condições competitivas do negócio.
Sobre o autor:
Jeferson Sena é sócio-diretor da Ninho Desenvolvimento Empresarial, especialista em projetos de organização e reestruturação de empresas, desenvolvimento, implementação e gestão de planejamento estratégico.
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